Diretor da clínica e funcionário foram presos em flagrante
Fau Barbosa
Neste domingo, 5, por volta das 11h15, Policiais Militares faziam patrulhamento de rotina em Itapevi, quando receberam um comunicado, via Copom, de que havia uma ocorrência de maus tratos em uma clínica de reabilitação para dependentes químicos, na Vila Belmira.
Os policiais foram até o local informado, e se depararam com a solicitante, que estava na via pública, discutindo com um suposto funcionário da clínica. Ele se identificou como terapeuta.
Havia também outros familiares no local. Eles relatavam que os internos não tinham água potável, alguns estavam dopados por medicação e que sofriam agressão física. Diante disso, os policiais entraram no local, acompanhados de um funcionário.
Naquele momento, não havia qualquer outro funcionário ou responsável pelo local. Questionado se havia algum médico ou enfermeira responsável, ele respondeu que não.
No local, constatou-se a presença de 61 pessoas de diversas idades, que estariam internados, em tratamento para dependência química. Os policiais encontraram um interno que estava aparentemente dopado. Foi solicitado o atendimento do SAMU, mas quando este chegou ao local esse interno já estava melhor e, por isso, não houve necessidade de encaminhá-lo para socorro.
Denúncia
Uma mulher teria ido ao local visitar o enteado que estava internado há um mês. Essa seria a primeira visita, autorizada somente após 30 dias de internação. A visita estava agendada e ao chegar ao local, ela foi atendida por um paciente. Em seguida, localizou o enteado e pediu um copo de água. "Ele trouxe um copo de água mas a água tinha uma coloração escura. Eu questionei de onde era aquela água e ele falou que era a água que eles consumiam no local. Ele relatou que não queria mais ficar na clínica, dizia que era horrível, que passavam fome e que sofriam agressão física", enfatizou.
Ela então questionou a ele quem era o proprietário da clínica, e ele disse que os donos não estavam, que só havia um funcionário lá.
"Ao tentar conversar com ele, ele disse que não era funcionário e que não tinha nada para falar para mim. Diante disso, eu acionei a Polícia Militar. Nós pagávamos R$1.200,00 (um mil e duzentos reais mensais)", ressaltou.
Maus tratos
Logo que chegaram ao local, os policiais foram encontrando vários internos, que ao serem interpelados, relataram que passavam fome, bebiam água barrosa e que sofriam agressão física.
Os relatos dos internos, em síntese, indicaram a precariedade do local onde as vítimas eram mantidas, como, por exemplo, ausência de água potável, alimentação controlada, limite de um minuto para higiene pessoal (banho), em um local completamente sem estrutura para atender os mais de 60 (sessenta) indivíduos internados e sem qualquer assistência médica.
Além disso, também houve diversos relatados de verdadeiros episódios de tortura a que as vítimas eram submetidas sempre que desatendiam qualquer desejo ou ordem da administração do estabelecimento.
Local sem nome nem documentação
Depois de algum tempo, chegou no local um indivíduo que se identificou como diretor do local, afirmando ser o único proprietário e responsável pela clínica. Ele relatou que o local era um 'lar de recuperação para dependentes químicos'. Ao ser questionado sobre o nome da clínica e os documentos, ele afirmou que o local é novo, não tem nome nem documentos, porque estava em processo de regularização.
Diante dos fatos, foram acionamos os fiscais de postura do município e a Guarda Civil de Itapevi. Os dois indivíduos, proprietário e funcionário, bem como alguns internos, foram levados ao DP de Itapevi para as providências.
Relato de interno
Um dos internos, de 27 anos, contou à Polícia que é dependente de cocaína e foi internado na Clínica há cerca de quarenta dias. Na sexta-feira, dia 03, por volta das 18h, ele teria sofrido agressão porque eu queria usar o banheiro no horário da oração. "Depois de alguns minutos, me chamaram para ir até o escritório da clínica, que fica numa espécie de porão, numa área aberta na parte de baixo da casa, onde estava o diretor da clínica, um funcionário e um terceiro homem. Eles me colocaram sentado numa cadeira e disseram que eu tinha que respeitar a casa. Em seguida, o funcionário mandou eu esticar as mãos, com as palmas abertas para cima e bateu duas vezes com um pedaço de pau em cada mão. Em seguida, deu um mata-leão em mim e o outro cara deu pauladas na minha perna.
Segundo o relato, o diretor só ficava sentado na cadeira, olhando. Em determinado momento teria dito que o interno estava mentindo. "Ele deu dois socos na minha barriga. Deram socos nas minhas costas. Por fim, um dos homens deu um chute na minha barriga e me derrubou", relatou.
O delegado Dr. Adair Marques esteve no local e solicitou perícia. Ele falou à reportagem do Portal Viva. "Inclusive, alguns dos internos ainda apresentam lesões aparentes, que atribuem às sessões de agressão física a que foram submetidas no local", disse.
Diante da situação, muitos familiares estiveram no local para retirar os internos. Eles apontaram um filtro de água, com galão de 20 litros, que estava em uma área aberta e cuja água seria usada para consumo dos internos. A água do referido galão estava com coloração marrom.
As vítimas foram conduzidas para exame de corpo de delito.
Fiscais da Prefeitura estiveram na clínica e constataram que o local não tinha licença para funcionamento, sendo lavrado auto de infração por falta de alvará de funcionamento. No local foram encontrados seis contratos de prestação de serviço. A clínica foi lacrada.
O delegado representou pela Prisão Temporária do diretor, de 28 anos e do funcionário, de 35 anos.
O caso foi registrado no DP de Itapevi, em boletim de ocorrência de natureza "Maus-tratos (art. 136) e Tortura - Tortura (Art. 1º) - L 9.455/97 - II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo".
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